quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Formação baseada em competências no ensino superior

A pedagogia das competências


Nessa concepção de ensino, a educação deve estar voltada para o desenvolvimento de competências. Mas, nesse contexto, o que significa a palavra competência?
A competência profissional é definida pelas Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para o Funcionamento dos Cursos Superiores de Tecnologia como:
“ Art. 7º Entende-se por competência profissional a capacidade pessoal de mobilizar, articular e colocar em ação conhecimentos, habilidades, atitudes e valores necessários para o desempenho eficiente e eficaz de atividades requeridas pela natureza do trabalho e pelo desenvolvimento tecnológico”. (BRASIL, 2002b).
Como exemplo de aquisição de uma competência, podemos citar uma pessoa que está aprendendo a dirigir. Quando ela entende porque e quando é necessário trocar a marcha, ela adquiriu um dos conhecimentos necessários. A partir do momento que esse aprendiz troca a marcha com facilidade, foi adquirida uma das habilidades necessárias para dirigir.  Conduzir o veículo respeitando as leis de trânsito e os demais motoristas e pedestres, mostra que essa pessoa tem a atitude de um bom motorista. Portanto, podemos dizer que a competência envolve sempre: conhecimento, habilidade e atitude. A competência fica evidente quando a pessoa consegue mobilizar seus conhecimentos para resolver problemas e reagir diante das várias situações da vida.
“A noção de competência remete para situações nas quais é preciso tomar decisões e resolver problemas, associa-se à compreensão e avaliação de uma situação, uma mobilização de saberes, de modo a agir/reagir adequadamente. Desta forma, a tomada de decisão (expressar conflitos, oposições), a mobilização de recursos (afetivos e cognitivos) e o saber agir (saber dizer, saber fazer, saber explicar, saber compreender) são as características principiais da competência. Estas características permitem entender este conceito como uma forma de controlar (simbolicamente) as situações da vida”. (DIAS, 2010).
Uma pessoa demonstra que tem competência quando consegue aplicar seus conhecimentos com habilidade e ao mesmo tempo ter atitudes adequadas, portanto, a noção de competência envolve também o comportamento do indivíduo. Perrenoud (2000 apud GENTILE e BENCINI, 2000) explica que “Competência é a faculdade de mobilizar um conjunto de recursos cognitivos (saberes, capacidades, informações etc.) para solucionar com pertinência e eficácia uma série de situações”. Esse mesmo autor dá alguns exemplos: 
“Saber orientar-se em uma cidade desconhecida mobiliza as capacidades de ler um mapa, localizar-se, pedir informações ou conselhos; e os seguintes saberes: ter noção de escala, elementos da topografia ou referências geográficas. Saber curar uma criança doente mobiliza as capacidades de observar sinais fisiológicos, medir a temperatura, administrar um medicamento; e os seguintes saberes: identificar patologias e sintomas, primeiros socorros, terapias, os riscos, os remédios, os serviços médicos e farmacêuticos. Saber votar de acordo com seus interesses mobiliza as capacidades de saber se informar, preencher a cédula; e os seguintes saberes: instituições políticas, processo de eleição, candidatos, partidos, programas políticos, políticas democráticas, etc.”. (PERRENOUD, 2000).
A noção de competência é complexa, para desenvolvê-la não basta passar informações e transmitir conhecimentos, é necessário criar um contexto para mobilizar esses conhecimentos.
“Em síntese, a competência é uma combinação de conhecimentos, motivações, valores e ética, atitudes, emoções, bem como outros componentes de caráter social e comportamental que, em conjunto, podem ser mobilizados para gerar uma ação eficaz num determinado contexto particular. Permite gerir situações complexas e instáveis que exigem recorrer ao distanciamento, à metacognição, à tomada de decisão, à resolução de problemas. Podemos, pois, afirmar que a competência se caracteriza por ser complexa, projetada no futuro (numa aposta nos poderes do tornar-se). Exerce-se em situação, é completa, consciente e transferível para outros contextos”. (DIAS, 2010).
A escola atual desenvolve competências? Conforme explica PERRENOUD (2000 apud GENTILE e BENCINI, 2000), “[...] os alunos acumulam saberes, passam nos exames, mas não conseguem mobilizar o que aprenderam em situações reais, no trabalho e fora dele (família, cidade, lazer etc.)” A escola não trabalha suficientemente a mobilização dos conhecimentos, e isso é mais grave ainda para quem freqüenta a escola por pouco tempo. Para desenvolver competências é necessário dedicar tempo exercitando a mobilização das competências para resolver problemas em situações complexas.
“Para desenvolver competências é preciso, antes de tudo, trabalhar por problemas e por projetos, propor tarefas complexas e desafios que incitem os alunos a mobilizar seus conhecimentos e, em certa medida, completá-los. Isso pressupõe uma pedagogia ativa, cooperativa, aberta para a cidade ou para o bairro, seja na zona urbana ou rural”. (PERRENOU, 2000, apud GENTILE e BENCINI, 2000).
Os professores devem planejar situações de aprendizagem que tenham sentido para os alunos, envolvendo-os em situações desafiadoras, valorizar a interdisciplinaridade e de essa forma prepará-los para a vida.
“Uma abordagem ao ensino/aprendizagem por competências incita a considerar os saberes como recursos a serem mobilizados, a trabalhar por meio de problemas, a criar e/ou (re)utilizar novas metodologias de ensino/aprendizagem, a negociar e a desenvolver projetos com os alunos, a optar por uma planificação flexível, a incentivar o improviso, a caminhar no sentido de uma maior integração disciplinar, na direção do desenvolvimento de um trabalho multidisciplinar”. (DIAS, 2010).
 Formação Profissional por competências no Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI):

A Pedagogia das Competências está muito ligada ao ensino técnico, justamente por isso é que o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) tem dado uma importância muito grande a esse tema, produzindo material que serve de referência a aqueles que desejam saber mais sobre o assunto. No SENAI, essas metodologias foram concebidas a partir de 1999, com o apoio de consultorias da Espanha: Instituto Nacional do Empleo (INEM) e do Centro Interamericano para el desarrollo del Conocimiento em la Formación Profesional (OIT/CINTERFOR). O SENAI justifica a necessidade da aplicação dessa metodologia da seguinte maneira:
“O mundo do trabalho passa por mudanças significativas, que repercutem profundamente no mundo da educação. A generalização do uso e aplicações da microinformática; a compreensão do trabalho como algo além de conhecimentos técnicos, envolvendo habilidades comunicativas e comportamentais; a necessidade de transferência de conhecimentos entre áreas profissionais distintas – todos esses elementos exigem a estruturação de uma educação profissional dinâmica, renovada, em sintonia constante com os movimentos do setor produtivo”. (SERVIÇO NACIONAL DE APRENDIZAGEM INDUSTRIAL, 2009b, p. 07).
Essa concepção busca colocar e educação em “sintonia” com o mercado de trabalho, atendendo as suas necessidades. O desenvolvimento de competências profissionais deve ter um papel central em todas as etapas do trabalho escolar, desde o planejamento até a avaliação dos cursos. Essas competências são definidas como:
 “Entende-se por competência profissional a mobilização de conhecimentos, habilidades e atitudes profissionais necessários ao desempenho de atividades ou funções típicas, segundo padrões de qualidade e produtividade requeridos pela natureza do trabalho”. (SERVIÇO NACIONAL DE APRENDIZAGEM INDUSTRIAL, 2009b, p. 17)
Como exemplo de aquisição de uma competência profissional, podemos citar uma pessoa que está aprendendo a fazer uma instalação elétrica. Um dos conhecimentos necessários é conhecer o funcionamento dos componentes e como ligá-los corretamente; uma das habilidades necessárias é a capacidade de efetuar a tarefa manuseando corretamente as ferramentas; uma das atitudes indispensáveis é observar as normas técnicas e de segurança ao longo de todo trabalho. Portanto, conforme já foi escrito anteriormente, o conceito de competência é composto pelos conhecimentos, habilidades e atitudes. Para desenvolver competências, é importante simular situações reais de trabalho, pois, a competência é entendida como um conceito relacional que:
“[...] envolve a mobilização das capacidades das pessoas para as situações reais de trabalho. As descrições dessas competências devem fazer sentido para empregadores e trabalhadores”. (SERVIÇO NACIONAL DE APRENDIZAGEM INDUSTRIAL, 2009b, p. 18)
Nessa concepção, além dos conhecimentos técnicos e científicos, a escola deve propiciar ao aluno um ambiente onde ele possa desenvolver a capacidade de trabalho em grupo, tomada de decisões, planejamento, etc.
“[...] engloba não só as capacidades técnicas requeridas para o exercício de uma atividade concreta, como também um conjunto de comportamentos interativos, como tomada de decisões, comunicação com o ambiente, organização do trabalho ou outros necessários ao pleno desempenho profissional em um determinado campo de atuação”. (SERVIÇO NACIONAL DE APRENDIZAGEM INDUSTRIAL, 2009b, p. 18)
O perfil do profissional de uma determinada área de trabalho é composto pelo conjunto das competências profissionais que o aprendiz deve adquirir ao final do curso de formação. O SENAI entende o perfil profissional como: 
“É a descrição do que idealmente é necessário saber realizar no campo profissional correspondente a determinada qualificação. É o marco de referência, o ideal para o desenvolvimento profissional, que, confrontado com o desempenho real das pessoas, indica se elas são ou não competentes, se estão ou não qualificadas para atuar em seu âmbito de trabalho. É expresso em termos de competências profissionais”. (SERVIÇO NACIONAL DE APRENDIZAGEM INDUSTRIAL, 2009b, p. 11)
O perfil profissional de cada qualificação é elaborado pelo Comitê Técnico Setorial, que é um grupo de trabalho que tem a função de identificar e atualizar permanentemente as competências profissionais dos trabalhadores. O Comitê Técnico Setorial é formado por especialistas do SENAI, empresas, sindicato dos trabalhadores, sindicato patronal, entidades de classe, meio acadêmico, órgãos do poder público que são ligados a área do trabalho, indústria, educação ou Ciência e Tecnologia.

 
 
O Comitê Técnico Setorial elabora o perfil profissional, a partir desse perfil, ocorre à elaboração do desenho curricular e a oferta formativa.
 
A noção de competência nos documentos oficiais que regulamentam o Ensino Superior
 
Nos documentos oficiais que regulamentam o ensino superior, a noção de “competência” aparece com muita freqüência. O Catálogo Nacional de Cursos Superiores de Tecnologia define o Curso Superior de Tecnologia como: 
“É um curso de graduação, que abrange métodos e teorias orientadas a investigações, avaliações e aperfeiçoamentos tecnológicos com foco nas aplicações dos conhecimentos a processos, produtos e serviços. Desenvolve competências profissionais, fundamentadas na ciência, na tecnologia, na cultura e na ética, tendo em vista ao desempenho profissional responsável, consciente, criativo e crítico. [...]” (BRASIL, 2010, p. 126)
Portanto, conforme o catálogo, os cursos superiores de tecnologia desenvolvem competências profissionais. Essa noção aparece também na descrição de vários cursos do catálogo, por exemplo, na descrição do Curso Superior de Tecnologia em Eletrônica, conforme BRASIL (2010, p. 22), o profissional formado “[...] Atua no controle de qualidade e gestão da produção de eletroeletrônicos. Com competências fundamentadas em eletrônica, componentes e dispositivos eletroeletrônicos, [...]”. Porém, a competência profissional dos tecnólogos não fica limitada apenas a competências técnicas, pois conforme (BRASIL, 2010, p. 22): “Este tecnólogo atua também na melhoria de produtos e na gestão de projetos, aliando competências das áreas de gestão, qualidade e preservação ambiental.”

 A noção de competência aparece com muito destaque também nas Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a organização e o funcionamento dos Cursos Superiores de Tecnologia, conforme pode ser verificado no primeiro artigo do documento:  
“Art. 1º A educação profissional de nível tecnológico, integrada às diferentes formas de educação, ao trabalho, à ciência e à tecnologia, objetiva garantir aos cidadãos o direito à aquisição de competências profissionais que os tornem aptos para a inserção em setores profissionais nos quais haja utilização de tecnologias”. (BRASIL, 2002a)
As Diretrizes (BRASIL, 2002a) determinam como uma das funções dos cursos superiores de tecnologia: “[...] desenvolver competências profissionais tecnológicas, gerais e específicas, para a gestão de processos e a produção de bens e serviços; [...]”

A noção de competência profissional tem muita influencia na organização curricular dos cursos: 
“Art. 6º A organização curricular dos cursos superiores de tecnologia deverá contemplar o desenvolvimento de competências profissionais e será formulada em consonância com o perfil profissional de conclusão do curso, o qual define a identidade do mesmo e caracteriza o compromisso ético da instituição com os seus alunos e a sociedade”.
§ 1º A organização curricular compreenderá as competências profissionais tecnológicas, gerais e específicas, incluindo os fundamentos científicos e humanísticos necessários ao desempenho profissional do graduado em tecnologia.
§ 2º Quando o perfil profissional de conclusão e a organização curricular incluírem competências profissionais de distintas áreas, o curso deverá ser classificado na área profissional predominante. (BRASIL, 2002a)
Com base no texto citado acima, é possível concluir que para determinar as competências desenvolvidas, o ponto de partida é estabelecer o perfil profissional do concluinte do curso.
 
As competências profissionais também são citadas nas diretrizes curriculares de outros cursos superiores, como exemplo as Diretrizes Curriculares Nacionais do curso de Graduação em Ciências Econômicas:
“Art. 4º Os cursos de graduação em Ciências Econômicas devem possibilitar a formação profissional que revele, pelo menos, as seguintes competências e habilidades”:
I - desenvolver raciocínios logicamente consistentes;
II - ler e compreender textos econômicos;
III - elaborar pareceres, relatórios, trabalhos e textos na área econômica;
IV - utilizar adequadamente conceitos teóricos fundamentais da ciência econômica;
V - utilizar o instrumental econômico para analisar situações históricas concretas;
VI - utilizar formulações matemáticas e estatísticas na análise dos fenômenos socioeconômicos; e
VII - diferenciar correntes teóricas a partir de distintas políticas econômicas. (BRASIL, 2007)
 Nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica (RESOLUÇÃO CNE/CP Nº 1, de 18 de Fevereiro de 2002), a formação de competências ocupa um lugar central.
“Art. 4º Na concepção, no desenvolvimento e na abrangência dos cursos de formação é fundamental que se busque”:
I - considerar o conjunto das competências necessárias à atuação profissional;
II - adotar essas competências como norteadoras, tanto da proposta pedagógica, em especial do currículo e da avaliação, quanto da organização institucional e da gestão da escola de formação. (BRASIL, 2002b)
As competências a serem desenvolvidas são o ponto de partida e devem guiar a construção do projeto pedagógico dos cursos:
“Art. 6º Na construção do projeto pedagógico dos cursos de formação dos docentes, serão consideradas”:
I - as competências referentes ao comprometimento com os valores inspiradores da sociedade democrática;
II - as competências referentes à compreensão do papel social da escola;
III - as competências referentes ao domínio dos conteúdos a serem socializados, aos seus significados em diferentes contextos e sua articulação interdisciplinar;
IV - as competências referentes ao domínio do conhecimento pedagógico;
V - as competências referentes ao conhecimento de processos de investigação que possibilitem o aperfeiçoamento da prática pedagógica;
VI - as competências referentes ao gerenciamento do próprio desenvolvimento profissional. (BRASIL, 2002b) 
Algumas críticas com relação à formação baseada em competências



A Pedagogia das Competências também é alvo de críticas. As autoras (DIAS e LOPES, 2003) no seu artigo  Competências na formação de professores no Brasil: o que (não) há de novo” fazem uma análise da centralidade do conceito de competências na reforma curricular da formação de professores no Brasil nos anos de 1990 e chamam a atenção para a vinculação da educação com o mercado:
"[...] mantém-se nas recentes reformas a vinculação entre educação e interesses do mercado, já identificada em outras épocas: cabe à educação de qualidade a formação de capital humano eficiente para o mercado". (DIAS e LOPES, 2003) 
Também argumentam que não é novidade a teoria curricular baseada no desenvolvimento de competências, afirmam que essa teoria já foi empregada em outros tempos e espaços educacionais, sendo portanto uma recontextualização. 

"Procuramos demonstrar como o conceito de competências não é uma novidade na teoria curricular, já tendo sido empregado em diferentes tempos e espaços educacionais, tanto global quanto localmente. Como exemplo, analisamos a literatura que embasou programas americanos e brasileiros para a formação de professores nos anos de 1960 e nos anos de 1970. Defendemos que nos documentos das reformas educacionais brasileiras dos anos de 1990 é feita uma recontextualização do conceito de competências desses programas americanos e brasileiros para formação de professores, sendo por intermédio desse conceito recontextualizado que se articula a estreita relação entre educação e mercado". (DIAS e LOPES, 2003)
 
As mesmas autoras mostram preocupação com a proposta de currículo para a formação de professores sustentada pelo desenvolvimento de competências, afirmando que essa concepção tende a colocar num segundo plano o conhecimento teórico e a sua mediação pedagógica.
"Nessa concepção, o conhecimento sobre a prática acaba assumindo o papel de maior relevância, em detrimento de uma formação intelectual e política dos professores".  (DIAS e LOPES, 2003)
 DIAS e LOPES (2003), argumentam que o modelo de competências na formação profissional de professores atende a construção de um docente mais controlado na produção do seu trabalho, que é muito cobrado individualmente pelos resultados, “embora o discurso aponte para a construção de um trabalho coletivo, criativo, autônomo e singular” (DIAS e LOPEZ, 2003). Chamam a atenção para o fato de que as disciplinas e os conteúdos passam a ter importância somente para a formação de competências:  
“O modelo que está sendo questionado para o currículo da formação de professores no Brasil é o que se baseia nas experiências acadêmicas, desenvolvido especialmente nas universidades. Desse modo, a recontextualização do currículo da formação de professores baseada nas competências modifica o foco da aprendizagem escolar, na qual os conteúdos e as disciplinas passam a ter valor apenas como meios para constituição de competências”. (DIAS e LOPES, 2003) 
Enfim, as autoras mostram a necessidade de alternativas curriculares para a formação dos professores.
“A expectativa que se aponta para os educadores e para a sociedade em geral no momento é de que seja possível a construção de um espaço público de diálogo e de formulação de alternativas curriculares para a formação de professores, capaz de responder às críticas ao currículo por competências. Especialmente no que concerne ao aligeiramento da formação docente e às restrições da atuação intelectual e política dos professores”. (DIAS e LOPES, 2003)
O autor Newton Duarte (DUARTE, 2001) classifica a Pedagogia das Competências, como sendo integrante do grupo das pedagogias do “aprender a aprender” e argumenta que essa pedagogia busca a adaptação ao que é determinado pela sociedade capitalista e não a transformação da realidade social:  
“Quando educadores e psicólogos apresentam o “aprender a aprender” como síntese de uma educação destinada a formar indivíduos criativos, é importante atentar para um detalhe fundamental: essa criatividade não deve ser confundida com busca de transformações radicais na realidade social, busca de superação radical da sociedade capitalista, mas sim criatividade em termos de capacidade de encontrar novas formas de ação que permitam melhor adaptação aos ditames da sociedade capitalista”. (DUARTE, 2001)
 A partir do texto citado acima, é possível concluir que na opinião do autor, a formação por competências busca desenvolver nos alunos uma criatividade que é sempre voltada para situações de trabalho, e não a fim de buscar soluções para os problemas sociais.
 
A autora Lúcia Maria Wanderley Neves (NEVES, 2003) se refere a essa pedagogia como “... este novo modismo educacional, trazido ao Brasil pelos neoliberais no poder.” Essa mesma autora faz uma resenha do livro “A pedagogia das competências: autonomia ou adaptação?” da autora Marise Nogueira Ramos (RAMOS, 2001), e faz os seguintes comentários: 
“Nos diversos sistemas de competência profissional analisados, a competência está sempre associada à capacidade de o sujeito desempenhar-se satisfatoriamente em situações reais de trabalho, mobilizando os recursos cognitivos e socioafetivos, além de conhecimentos específicos. Nesse sentido, em qualquer abordagem, o corolário é: a competência é indissociável da ação. 3ª) Em todas as metodologias de investigação dos processos de trabalho, a competência humana é tomada como fator de produção”. (NEVES, 2003)
É perceptível a preocupação com a redução do ensino a formar mão de obra para o mercado de trabalho, a direcionar a capacidade humana apenas para atender ao mercado e alienar-se dos problemas sociais.

O autor Celso João Ferretti (FERRETTI, 2002), também comenta o livro de Marise Nogueira Ramos: 
“[...] Diante desse tipo de proposta, a autora faz uma indagação que, além de servir de subtítulo ao livro, percorre-o de alto a baixo: tal pedagogia conduz à autonomização dos sujeitos a ela expostos ou à sua mera adaptação às mudanças no trabalho e na vida social”? (FERRETTI, 2002)
A pedagogia das competências defende a interdisciplinaridade, porém como comenta FERRETTI:
“Ramos assume posição crítica em relação à proposta de interdisciplinaridade pelo fato de que, na forma proposta, esta se presta à desvalorização dos saberes escolares organizados em torno das disciplinas e à seleção instrumental dos conteúdos a serem ensinados, secundarizando o olhar reflexivo sobre estes [...]”. (FERRETTI, 2002)
Nos textos citados aparece com freqüência a preocupação que a Pedagogia das Competências leve os formandos a “adaptação” e não a serem indivíduos autônomos. Porém, o autor Philippe Perrenoud (2000, apud GENTILE e BENCINI, 2000) cita “as competências fundamentais para a autonomia das pessoas”: 
“Eu tentei um exercício para identificar as competências fundamentais para a autonomia das pessoas. Cheguei a oito grandes categorias: saber identificar, avaliar e valorizar suas possibilidades, seus direitos, seus limites e suas necessidades; saber formar e conduzir projetos e desenvolver estratégias, individualmente ou em grupo; saber analisar situações, relações e campos de força de forma sistêmica; saber cooperar, agir em sinergia, participar de uma atividade coletiva e partilhar liderança; saber construir e estimular organizações e sistemas de ação coletiva do tipo democrático; saber gerenciar e superar conflitos; saber conviver com regras, servir-se delas e elaborá-las; saber construir normas negociadas de convivência que superem diferenças culturais”. [...] (PERRENOUD, 2000, apud GENTILE e BENCINE, 2000)

CONCLUSÃO: 

 
A noção de competência profissional está muito ligada ao ensino técnico e tecnológico, mas também está presente nos demais cursos de graduação, inclusive em cursos de formação de professores. Desenvolver competências é preparar os alunos para situações reais que eles encontrarão em sua vida profissional, por isso é necessário trabalhar com projetos, situação problema e envolver os alunos em situações desafiadoras e complexas.

Essa concepção está muito presente nos documentos oficiais que tratam do ensino superior. No Catálogo Nacional de Cursos Superiores de Tecnologia, vários cursos são descritos em função das competências que devem ser desenvolvidas. Nas Diretrizes Curriculares, as competências que compõem o perfil profissional são as norteadoras para elaboração da matriz curricular e planejamento dos cursos. Portanto, o ponto de partida é analisar o perfil profissional, ou seja, o que o estudante será capaz de fazer quando concluir o curso. Após definido o perfil profissional, verifica-se quais são as competências que serão desenvolvidas e estabelece as estratégias e recursos necessários.

Essa concepção de ensino é alvo de muitas críticas, pois seria voltada a formar apenas mão de obra qualificada para o mercado de trabalho, deixando em segundo plano a transformação da sociedade. Porém, conforme citado anteriormente, (PERRENOUD 2000, apud GENTILE e BENCINI, 2000), pode ser definida competências visando à formação de um cidadão autônomo que irá atuar na vida em sociedade. Seria um grande erro afirmar que as escolas e universidades têm como única função desenvolver competências profissionais. Porém, é um grande equívoco negar essa função das escolas e universidades, pois os cursos que formam profissionais devem garantir que os profissionais formados tenham as competências necessárias para exercer a profissão escolhida.


Artigo apresentado como trabalho de conclusão do curso de Especialização em Metodologia do Ensino Superior - CESCAGE.
Autor: Prof. Renato Dalzotto
 
 
REFERÊNCIAS:
 
BRASIL. Catálogo Nacional de Cursos Superiores de Tecnologia. 2010.
 
BRASIL, CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO. Diretrizes Curriculares Nacionais do curso de Graduação em Ciências Econômicas, bacharelado: RESOLUÇÃO N° 4, DE 13 DE JULHO DE 2007.
 
BRASIL, CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO. Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a organização e o funcionamento dos cursos superiores de tecnologia: RESOLUÇÃO CNE/CP 3, DE 18 DE DEZEMBRO DE 2002b.
 
BRASIL, CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica: RESOLUÇÃO CNE/CP Nº 1, de 18 de Fevereiro de 2002a.
 
DIAS, ISABEL SIMÕES. Competências em educação: conceito e significado pedagógico. Psicol. Esc. Educ. (Impr.) vol.14 no. 1 Campinas Jan./June 2010. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-85572010000100008&lang=pt > Acesso em: 22 dez. 2010.
 
DIAS, ROSANNE EVANGELISTA; LOPES, ALICE CASIMIRO. Competências na formação de professores no Brasil: o que (não) há de novo. Educ. Soc. vol.24 no.85 Campinas Dec. 2003. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-73302003000400004&lang=pt  > Acesso em: 22 dez. 2010.
 
DUARTE, NEWTON. As pedagogias do “aprender a aprender” e algumas ilusões da assim chamada sociedade do conhecimento. Revista Brasileira de Educação. N.18. Set/Out/Nov/Dez 2001.
 
FERRETTI, CELSO JOÃO. A pedagogia das competências: autonomia ou adaptação? Educ. Soc. vol.23 no. 81 Campinas Dec. 2002.  Disponível em: < http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-73302002008100016&lang=pt > Acesso em: 22 dez. 2010.
 
GENTILE, PAOLA; BENCINI, ROBERTA. (2000). Construindo competências - Entrevista com Philippe Perrenoud. Disponível em: < http://www.unige.ch/fapse/SSE/teachers/perrenoud/php_main/php_2000/2000_31.html >  Acesso em: 22 dez. 2010.
 
NEVES, LÚCIA MARIA WANDERLEY. A pedagogia das competências: autonomia ou adaptação? Rev. Bras. Educ. n.22 Rio de Janeiro Jan./Apr.2003. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-24782003000100017&lang=pt>. Acesso em: 22 dez. 2010.
 
PERRENOUD, PHILIPPE. Construir as competências desde a escola. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1999.
 
RAMOS, MARISE NOGUEIRA. A pedagogia das competências: autonomia ou adaptação? São Paulo: Cortez, 2001.
 
SERVIÇO NACIONAL DE APRENDIZAGEM INDUSTRIAL. Metodologias SENAI para formação profissional com base em competências: elaboração de desenho curricular. 3. ed. Brasília: [s.n.], 2009a.
 
SERVIÇO NACIONAL DE APRENDIZAGEM INDUSTRIAL. Metodologias SENAI para formação profissional com base em competências: Elaboração de perfis profissionais por comitês técnicos setoriais. 3. ed. Brasília: [s.n.], 2009b.
 
SERVIÇO NACIONAL DE APRENDIZAGEM INDUSTRIAL. Metodologias SENAI para formação profissional com base em competências: norteador da prática pedagógica. 3. ed. Brasília: [s.n.], 2009c.

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